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Campo Grande, 20 de abril

Com segunda maior população indígena do país, representação em cargos eletivos ainda é um desafio em MS

Apesar do aumento no número de candidatos, percentual de candidaturas indígenas se manteve entre 2016 e 2018

Por Alan Kaká/CBN
02/10/2020 • 16h28
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Os dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) demonstram que, em Mato Grosso do Sul, apesar do número de indígenas na disputa por um cargo eletivo ser um pouco maior em 2020 que em relação a 2016, o percentual praticamente se manteve, passando de 2,61% para 2,51%.

 

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Enquanto o percentual de indígenas é de, aproximadamente, 3% do total da população de MS, há um déficit de representatividade dessa população nos cargos eletivos. Do total das cadeiras em disputa nos legislativos dos 79 municípios do estado, apenas 13 indígenas foram eleitos em 8 cidades.

 

Porém, em 2020, há cidades em que a porcentagem de indígenas disputando cadeiras eletivas é múltiplas vezes a média estadual. É o caso de Tacuru com 14 candidaturas indígenas, o que representa quase 20% do total de candidatos e, também, de Miranda, cujo percentual de indígenas na disputa chega a ser mais de 22% do total de candidaturas.

 

Mas o caso mais emblemático é o de Japorã, no sul do estado. Das 64 candidaturas à vereança, 33 são de autodeclarados indígenas, o que equivale a 51,56% do total. Na eleição municipal de 2016 o percentual de indígenas disputando cadeiras legislativas no município havia sido de 40,5%. Das 32 candidaturas indígenas, 3 alcançaram um mandato eletivo na Casa de Leis de Japorã em 2016 .

 

Em contraponto, com apenas 5 candidaturas, os indígenas de Dois Irmãos do Buriti conquistaram duas cadeiras no legislativo municipal no mesmo ano. Um deles é Eder Alcantara da etnia Terena, vereador em disputa pelo terceiro mandato na Casa de Leis da cidade. O vereador falou à Rádio CBN Campo Grande sobre como os indígenas têm se organizado.

 

"Me formei na graduação na UCDB e em sala de aula eu estava quando recebi o convite do cacique e da liderança da comunidade para disputar a eleição. 2012 a gente já entrou [na Câmara]. Essa foi minha primeira disputa eleitoral e eu fui o vereador mais votado da história do município em 2016. Ganhamos respaldo dentro do próprio município por ser indígena, também lutar e buscar emendas direcionadas ao nosso município, na nossa saúde, nossa educação, o que resultou na presidência da Câmara. E hoje é maravilhoso ver isso. Nem toda a comunidade tem 100% essa visão, mas os caciques são 100% e eu acho que toda sociedade é assim, a gente não consegue agregar 100%", conta o vereador sobre sua trajetória. 

 

 "Quando eu estive de presidente da Câmara a gente conseguiu unir os vereadores [indígenas] do estado de MS, fazendo três encontros. Um foi aqui em Dois Irmãos do Buriti. Então umas das coisas que a gente está abrangendo nesse política é o avanço dos cargos eleitorais. Alguns estão disputando a vice. Alguns vão disputar a prefeitura. Então isso é resultado desse trabalho", afirmou o indígena sobre a articulação eleitoral. 


Nas eleições deste ano, além de disputar cadeiras nos legislativos municipais e as vice-prefeituras como em eleições anteriores, dois indígenas disputam as principais cadeiras em seus municípios.

Anísio Guilherme da Fonseca, o Anísio Guató (PSOL), disputa a cadeira de prefeito em Corumbá e Wilson Matos (PTB), disputa o executivo municipal em Dourados. Matos falou à Radio CBN de Campo Grande. Como o vereador Eder Alcântara de Dois Irmãos do Buriti, Matos afirma que os indígenas têm se organizado em torno de projetos eleitorais que visem a melhora da qualidade das políticas públicas para as populações indígenas do estado. 

 

"Esse é um sonho antigo que a gente vêm sonhando juntos e vimos arregimentando ideias novas. Nesses últimos quatro anos nós aumentamos a articulação. Nós tivemos uma reunião com todos os parlamentares [indígenas] e também com os suplentes de vereadores em Dois Irmãos do Buriti. Fomos recebidos pela Câmara de Vereadores de lá, pelo vereador Eder e demais vereadores dessa região. Levamos lá todos os vereadores indígenas aqui do sul do estado. Então, os indígenas vêm conversando no sentido de formar representação política. Tudo nesta vida é política e as ações sociais são prestadas pelo Estado através da política. Nós precisamos se inteirar da política. Nos integrar à política. Isso seria integração. Não aquela da Lei 6001 que quer transformar o índio em branco. Jamais uma lei vai fazer isso. Mas politicamente nós precisamos nos integrar e é por isso que a gente vem conversando para formar lideranças políticas nos municípios com a finalidade de nós ocuparmos espaço na Assembléia Legislativa, na Câmara Federal, no intuito de defender as políticas destinadas às comunidades indígenas", explicou o candidato a prefeito de Dourados Wilson Matos.  

 

Ainda, segundo os dados do TSE, a capital do Estado tem um total de 802 candidaturas aos cargos de prefeito, vice e vereadores. Deste contingente, são apenas 6 indígenas e todos concorrem à vereança. Esse número representa menos de 1% do total de candidaturas. Apenas para efeito de comparação, há mais candidatos que se autodeclaram "amarelos", ou seja, de descendência asiática.

 

"Em Campo Grande nós temos uma população de 12 mil indígenas aproximadamente. Eu sou daqui da Aldeia Marçal de Souza. Nós estávamos fora das nossas aldeias de origem, mas a gente precisava dar um norte para os nossos, para o nosso executivo para saber o que nós queríamos enquanto política voltada para um povo que saiu da sua aldeia na esperança de ter uma qualidade de vida melhor", explica Silvana Dias, ou Silvana Terena, ex-subsecretária de Políticas Públicas para População Indígena do Governo do Estado de MS. 

 

Silvana deixou o cargo para concorrer a uma cadeira na Casa de Leis do município. Ela explica que a dificuldade em se estabelecer novas lideranças e candidaturas se deve a falta de espaço nos partidos a na própria administração pública.

 

"Então quando trazem o índio para a filiação, querem uma representatividade indígena, não quer o índio no poder. São duas situações diferentes. Na hora que o cidadão se elege prefeito ou vereador, você não tem na sua assessoria uma representação indígena que você dê suporte para ele, que você dê um salário para ele. Dê um suporte para ele poder andar e construir junto com a gestão do prefeito ou do vereador as ações. Você aprende na prática o que faz lá, o que um vereador faz. Então isso foi de muita aprendizagem para nós, também, fazer gestão dentro da Câmara Municipal. A arte da política é difícil. É um jogo bruto, mas para quem gosta é muito prazeroso", completa Silvana.

 

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