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Nobre atitude de cidadania e espiritualidade

Por Jacir Venturi
30/12/2017 • 11h57
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A solidariedade é intrínseca à condição humana, um dever moral que vai além da dimensão religiosa, pois todos somos gregários e frágeis. A bondade é tão relevante que 5 séculos a.C., nos limiares da filosofia, o pré-socrático Demócrito de Abdera assim aconselhava: “é preciso ou ser bom ou imitar quem o seja”.
Praticar o bem é um ato nobre e gratificante, sejam quais forem as motivações: espiritualidade, cidadania ou pela alegria de servir. Conta-se que um grande filantropo americano foi à Índia conhecer as ações de Madre Tereza e, surpreso com tanta misericórdia e dificuldade, teria exclamado: irmã, eu não faria esse trabalho por dinheiro algum do mundo. Ao que ela respondeu: eu também não. Imbuída de elevada religiosidade, ela manifesta a sua escala de valores: “as mãos que ajudam são mais sagradas que os lábios que rezam”.
O voluntariado é uma via de mão dupla, pois dá dignidade, supre necessidades básicas e leva tanto quanto possível autossuficiência à comunidade atendida. E a neurociência comprova que agir de modo altruísta, entre outros efeitos positivos, libera o hormônio oxitocina, que promove bem-estar, de cuja falta pode ocasionar estresse e depressão. Voluntarioterapia, um neologismo que se impõe diante de testemunhos: que esquecem os próprios problemas, pois são pequenos diante da realidade em que estão atuando; que não há voluntário triste quando em ação; ou que abandonaram terapias e remédios contra a tristeza e a depressão.
Zilda Arns – uma mártir do voluntariado, pois faleceu, em plena atividade comunitária, vítima do terremoto no Haiti em 2010 – se faz oportuna: “quem é voluntário não só dá, recebe muito mais”. Essa transcendentalidade está presente nas palavras de Gibran Khalil Gibran, humanista e escritor libanês: “O trabalho voluntário é para mim uma prece silenciosa. Deveis encontrar uma causa generosa à qual sacrificareis tempo e dinheiro, porque é assim que conhecereis a alegria de dar. Mais do que vossas posses, é quando derdes de vós próprios é que realmente dais”.
Inegavelmente, é a motivação religiosa que prepondera em atividades sociais de benemerência. Os fiéis que frequentam igrejas, sinagogas, mesquitas ou outros templos são mais generosos na doação de seu tempo e nas contribuições pecuniárias. Um estudo realizado nos EUA pela Charities Aid Foundation aponta que, em média, o americano religioso distribui 7% de sua renda para projetos sociais, correspondendo ao dobro dos 3,5% praticados pela população como um todo, em muito contrastando com os 0,3% da renda que os brasileiros dedicam às doações.
Certamente, não é menor a generosidade dos brasileiros, mas sim baixa a confiança em relação às associações de filantropia (quantas pilantrópicas?). A despeito, há um outro olhar, de enlevo e esperança, quando se convive com o expressivo número de abnegados que dedicam tempo e dinheiro às famílias necessitadas ou entidades assistenciais idôneas, sem que constem em qualquer estatística.
Até mesmo sem vínculos a crenças religiosas, muitos são os atores sociais movidos pelo espírito de cidadania, cujo estímulo advém do prazer de agregar valor à comunidade, ou até pelo desejo de serem reconhecidos. Sim, há aqueles que promovem ações voluntárias em busca de reconhecimento e autopromoção ou para vender uma boa imagem – mesmo assim não devem ser julgados, pois a entrega traz benefícios. É um narcisismo eficaz e ser apreciado é próprio da condição humana. Seja qual for a motivação, é sempre relevante a promoção de oportunidades de estudos e trabalho que propiciem autossuficiência e efetiva inclusão social.
Infelizmente, boa parte dos países ainda pratica a “economia da exclusão, que mantém os pobres na marginalidade” – se faz oportuno o Papa Francisco. E o Brasil é uma das nações em que há maior desigualdade social, não por escassez de recursos, e sim por injustiça e improbidade. É de se perguntar: o que choca mais, a pobreza ou a passividade diante dela? A bem da verdade, uma real e duradoura transformação de nosso país virá de uma contribuição muito significativa das ações comunitárias de cada um de nós e, concomitantemente, de uma pressão persistente a gestores públicos e melhores escolhas na eleição de nossos dirigentes e legisladores.
Acabamos de vivenciar o dia de Natal, época em que mais afloram os sentimentos da caridade cristã, que devem prevalecer para todo o ano de 2018, pois, quem não tem amor ao próximo e solidariedade em seu coração, sofre da pior doença cardíaca.

 


*É Coordenador na Universidade Positivo, foi diretor de escolas e professor da UFPR e PUCPR

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