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Família e escola: as duas asas do nosso educando

Por Jacir Venturi
28/07/2017 • 10h28
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Pais e professores são como duas asas de um pássaro: se não tiverem a mesma cadência, não haverá uma boa direção para o nosso educando. Família e escola devem ser vasos comunicantes, suprindo-se mutuamente. Pesquisa patrocinada pela Unicef mostra que, para 93% dos jovens brasileiros, a escola e a família são as instituições mais importantes da sociedade. A escola tem um papel primordial na melhoria do sistema educacional brasileiro, mas uma sustentabilidade consistente em qualidade, advirá somente com a inserção dos pais no processo de aprendizagem. Sim, a educação brasileira será salva não apenas pelos governantes, ou pelos professores, mas também por uma mudança cultural e de postura dos pais.

Há pais que acompanham o rendimento escolar do filho somente pelo boletim no final do bimestre. Todavia, o que faziam e fazem os sul-coreanos? Antes de dormir, um dos pais se achega:

— Filho(a), vamos abrir o livro e recordar o que você aprendeu na escola hoje?

Tudo de bom acontece nesse gesto: valorização do estudo, fixação do aprendizado do filho e crescimento intelectual dos pais. Sem falar da interação e da ternura que o momento propicia. E não menos importante: esse encontro amiúde permite aos pais um julgamento honesto da qualidade de ensino da escola.

Em recente visita à Finlândia, uma guia nos dizia que são comuns os protestos em prol da melhoria do ensino.

— Mas como, se os finlandeses detêm os primeiros lugares em desempenho nos testes internacionais? – pergunto surpreso.

— Sim, o resultado é fruto dessa cobrança — faz-se lacônica a guia.

É um círculo virtuoso: a população é bem instruída, colaborativa e cobra dos governantes uma boa educação para os filhos. O raciocínio é elementar: se deixarem de combater as falhas, perderão a excelência do ensino.

No Brasil, todavia, é recorrente e redundante: os nossos indicadores educacionais estão entre os piores do mundo. Com base em dados do IBGE, cerca de 1,7 milhão de jovens entre 15 e 17 anos (16% do total) abandonam a escola por ano, sendo o principal motivo, para 40% deles, a falta de vontade para estudar e ser a escola chata.

Qual o contexto desses alunos? Volto à analogia inicial: um bom voo para o nosso educando necessita de duas asas. Pais que não estimulam os estudos de seu filho, representam uma asa ferida. Semelhantemente, asa quebrada é a escola com professores desmotivados ou que repassam conteúdos desconectados com a realidade dos alunos. Ademais, a escola é o espaço não só da aprendizagem, mas também da interação social, manifestação da autoestima, do enlevo e da alegria.

Permita-me um depoimento pessoal: recém-formado em matemática, fui lecionar numa escola pública da periferia de Curitiba. Deparei-me com o primeiro grande paradoxo: a faculdade havia me ensinado muito de Matemática, mas nada como ensinar Matemática naquela comunidade. Toda escola é uma síntese do meio em que está inserida e, naquele caso, o escoadouro de todos os problemas sociais: violência, furtos, vandalismo, gravidez, DST, negligência afetiva e carências de todo o tipo, falta de alimento e higiene, ausência de mesa para realizar as tarefas escolares em casa, etc.

Havia sentido ensinar o que era apótema, eneágono? A diretora proativa e sensível aos anseios, permitiu que os professores negligenciassem parte do conteúdo pedagógico. A contrapartida foi um ensino focado no cotidiano do aluno, por meio de um trabalho interdisciplinar e contextualizado. Paulatinamente, colhíamos alunos mais interessados, participativos e com autoestima. No ano seguinte, o segundo grande paradoxo: não houve continuidade, pois, por iniciativa do Estado, a equipe foi desfeita, pela não-efetivação de alguns docentes ou para atender transferências a pedido de políticos.

Apropriadas são as palavras do pedagogo Pedro Demo: “aprender é como parto: é uma coisa linda, mas dói”. Retirar uma comunidade do atraso requer gestores e professores entusiastas, com visão holística e que vivenciem a realidade do aluno. Nenhum país atingiu um bom nível de ensino sem que, em algum momento de sua história, não houvesse uma opção preferencial pela valorização do professor: salário justo, na proporção do mérito e desempenho do docente, é um requisito relevante, mas, tão importante quanto, é o reconhecimento e o prestígio dessa nobilíssima profissão por parte da sociedade, como o fazem todas as nações com bom desempenho educacional. E o bom professor há de entender que lhe cabe a iniciativa do diálogo, da interação com a comunidade na qual a escola está inserida. Alterar o status quo de latência, apatia e falta de iniciativa do entorno da escola requer professores e gestores comprometidos, altruístas e respeitados pelas famílias.

Jacir J. Venturi é Coordenador da Universidade Positivo. Foi diretor de escolas e professor do Ensino Fundamental, Médio, Pré-Vestibular, da UFPR e PUCPR.

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