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Três Lagoas, 07 de maio

'O Brasil está perdendo a memória'

Professor da UFGD fala sobre perdas de itens irrecuperáveis de pesquisa científica queimados no Museu Nacional, do Rio

Por Loraine França
09/09/2018 • 07h00
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O incêndio que atingiu o prédio do Museu Nacional, no Rio de Janeiro (RJ), no domingo, dia 2, destruiu a maior parte dos cerca de 20 milhões de itens do acervo. Fósseis de animais primitivos, o crânio de Luzia - esqueleto humano mais antigo do Brasil -, artefatos indígenas de etnias que desapareçam e milhares de outros objetos foram consumidos pelas chamas que destruíram o prédio com 200 anos de existência.

O professor da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), Rogério Silvestre, disse que museu havia fósseis de animais encontrados em Mato Grosso do Sul. Como o crânio de 30 mil anos de uma espécie de cavalo encontrada no Pantanal, em 1974. “Se não tivermos um cuidado maior, seremos um povo sem memória. O Brasil está perdendo a memória”, lamenta. 

Jornal do Povo - Como foi sua relação com o Museu Nacional?

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Rogério - Recentemente, há uns dois anos, um aluno meu chamado Bhrenno Trad, esteve no museu para conhecer uma coleção de vespas. E, ele conseguiu, junto ao curador lá do museu, um empréstimo de mais de 80 vespas para fazer um estudo sobre a evolução dessas espécies. As vespas estão aqui, comigo, no laboratório, por empréstimo. Nós atrasamos a devolução e a programação era devolver até o final deste ano.  

JP - A tragédia levantou debates sobre os investimentos que o Brasil tem deixado de fazer tanto na cultura quanto na ciência. Como o sr. analisa isso?

Rogério - É exatamente essa a questão: o descaso da ciência como um todo. A falta de cuidado, não só com a história, mas, com a educação de  forma geral. Os itens de segurança básicos não foram respeitados e deixou-se à mercê dessa fragilidade da política brasileira, um patrimônio inestimável. Não se perdeu só a história lá do museu que está exposta para as pessoas verem. Se perderam, também, links de pesquisas com centenas de instituições esparramadas pelo mundo todo. 

JP - Há outros pesquisadores do Estado que também têm relação com o Museu Nacional?

Rogério - Eu fui informado que há o registro de um cavalo primitivo que é do Pantanal, chamado Equus vandonii, e um crânio [do animal] estava lá no Museu Nacional. Tem paleontólogos do museu que tem material da Serra da Bodoquena, fósseis de mamíferos encontrados na Gruta do Lago Azul, nos anos 2000. Há também uma pesquisa feita no Pantanal do Nabileque e no Passo do Lontra, onde foram coletadas várias espécies de libélulas, levadas para o Museu Nacional. 

JP - Como o sr. avalia as perdas destes materiais?

Rogério - É uma perda que vai demorar muitos anos para recuperar. Algumas coisas são irrecuperáveis, como artefatos de etnias indígenas que desapareceram. Esses artefatos novamente desapareceram, foram queimados. Isso mostra a fragilidade da vida, das coisas materiais que a gente constrói. Se não tivermos um cuidado maior, nós vamos ser um povo sem memória. O Brasil está perdendo a memória. 

JP - Quais dificuldades para novas pesquisas?

Rogério - Temos aqui uma coleção de insetos e materiais didáticos que é insignificante perto da coleção do Museu Nacional. Mas, é assim que se começa, um "embrião" de pessoas que se interessam pelo assunto e que vão juntando material. E nós quase não conseguimos trabalhar por falta de apoio. Não tem lugar para pôr material, não tem cuidado com a coleção nem investimento. Estou com um projeto há dois anos aprovado para infraestrutura da coleção nossa aqui e o dinheiro [do governo do Estado] não foi liberado. É um descaso geral no Brasil.

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