RÁDIOS
Três Lagoas, 20 de abril

Pesquisadora da UFMS contesta cadastramento de famílias no Cinturão

Coordenadora Maria Celma Borges acredita que loteamento está mal avaliado pelos técnicos da Prefeitura

Por André Barbosa
01/10/2017 • 06h15
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A coordenadora do Projeto de cadastramento socioeconômico das famílias do Cinturão Verde e levantamento cartográfico feito pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), Maria Celma Borges contesta os dados preliminares divulgados pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Agronegócios. Em entrevista ao Jornal do Povo, aponta que a pesquisa em andamento pela pasta do município foca apenas famílias rurais que comercializam seus produtos, se abstendo das que produzem para consumo próprio. A docente afirma ainda, que deve entregar no início do mês de outubro, um relatório completo sobre a área e seus moradores ao prefeito, solicitando a inclusão dos dados no material a ser entregue à Justiça, em dezembro.

Como surgiu a ideia de realizar o cadastramento do Cinturão Verde?

Maria Celma – “O projeto de cadastramento do Cinturão Verde desenvolvido pela UFMS, Campus de Três Lagoas acontece após solicitação de duas Associações do Cinturão, a Aspotrês e a Germinar. O intuito é o de contribuir com instrumentos que possam fundamentar a permanência das famílias que vivem da produção de alimentos na área do Cinturão Verde, no município de Três Lagoas, haja vista a imposição de um TAC (Termo de Ajustamento e Conduta) emitido pelo Ministério Público Estadual para que a Prefeitura Municipal regularize a situação da área”.

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Quando começou o Projeto e quando deve ser concluído?

O trabalho de extensão teve início entre os meses de Junho e Julho de 2017, sob a orientação de uma equipe de profissionais de diversas áreas (História, Geografia e Direito), que se articularam num processo sistematizado e utilizando metodologia de trabalho de campo, para que o maior número de famílias que ali residem fosse pesquisado, mas não a partir de uma mostra censitária e sim por quadrantes. Objetiva-se concluir este projeto no mês de Dezembro de 2017.

Qual foi a metodologia aplicada com os moradores?

Dos 184 lotes do Cinturão Verde, foram aplicados 112 questionários (cerca de 70% dos lotes do Cinturão), abrangendo questões acerca da produtividade do lote e da relação das famílias com a terra, entre outras informações. No momento, estamos sistematizando os dados coletados e realizando o trabalho de coleta de relatos, por meio da história oral.

E o que foi levantado até agora?

A ação de extensão tem mostrado a diversidade de famílias que ali residem, assim como as suas características de produção (hortifrutigranjeiro) e de plantio para o autoconsumo. Porém, como nos contam as famílias que vivem e produzem no Cinturão Verde, estas têm sido constantemente ameaçadas por especulações de órgãos municipais e de empresas privadas, que desejam deter este espaço para si e pelo que ele pode propiciar, a exemplo de investimentos privados, bem como acabar com a função social da terra, ao vislumbrarem a ocupação da área para outros fins que não o da produção de alimentos. Segundo os moradores e produtores da área, o contrato de comodato realizado pela prefeitura, para que eles possam continuar trabalhando e vivendo no Cinturão Verde, não tem sido renovado desde 2012, quando de seu vencimento, conforme ocorria anteriormente. Este, por si só, é um dos percalços que pode reforçar a ideia de que não há empenho dos órgãos responsáveis para resolver a situação de instabilidade e temor vividos por essas famílias, o que, consequentemente, pode resultar em prejuízo ainda maior para as mesmas.

Ainda assim, há quem ocupe o lote e não produz?

No trabalho de campo, constatamos problemas como alguns lotes que não estão sendo ocupados - ou que foram abandonados por um ou outro motivo, seja por questão de precariedade da saúde do comodatário ou outros fatores. E esta constatação é fundamental para que a Prefeitura e seus órgãos responsáveis acompanhem e deem uma destinação social aos mesmos. Partimos da premissa de que, possivelmente, haja uma lista de espera de produtores para o Cinturão Verde ou mesmo que se realoque famílias que estão dividindo uma mesma área de um hectare.

Os dados que o Projeto coletou até o momento, diferem em que, dos apresentados pela Secretaria Municipal de Agronegócios?

Reforçamos que a afirmação de que, “de 35 lotes apenas 5 são produtivos”, informação do engenheiro agrônomo da Semea, Manoel Latta Ernandes, que, em seguida, afirma que, “o levantamento teve início na semana passada e é realizado juntamente com o Centro de Referência e Assistência Social (Cras) da Vila Piloto e professores e alunos da UFMS, como noticiou uma matéria do Jornal do Povo, no dia 16 de setembro de 2017, não condiz com a realidade que vimos observando. Nós do projeto de extensão da UFMS/CPTL não somos responsáveis por esses dados, pois, como destacado anteriormente, o nosso levantamento vem apontando a existência de produção na maior parte dos lotes visitados e também há de se indagar o significado do que é ser produtivo. Em nosso entendimento, produzir para o autoconsumo, por si só, justifica a permanência na área e isto temos constatado em loco. Também há produção para o comércio, para a entrega em projetos como PNAE, PAA, para a venda na feira e nas ruas, entre outras situações.

Como o Projeto da UFMS poderá beneficiar as famílias do Cinturão?

Partindo dessas constatações, percebemos não apenas o desinteresse por parte dos responsáveis do município de Três Lagoas em fazer com que as famílias permaneçam na área, mas também é possível observar o desconhecimento da comunidade local em relação ao Cinturão Verde, seja pela forma como o noticiário costumeiramente se refere à área, de forma pejorativa, ou mesmo pela falta de políticas públicas que favoreçam a visibilidade da produção alimentar dessas famílias nesse cenário. Espera-se que projetos de extensão, como o que estamos desenvolvendo, que visem trazer instrumentos científicos e conscientização para a importância desta área e das famílias que lá estão, contribuam para que o Cinturão Verde possa ser conhecido em suas potencialidades e estas famílias não tenham que, forçosamente, abandonar esta área e a sua história. Ou o que é ainda pior, o protagonismo que as fazem lutar por um presente e um futuro digno e seguro.

A coordenadora finaliza a entrevista, afirmando que agendou para o dia 3 de outubro, reunião com o prefeito de Três Lagoas, Ângelo Guerreiro, a fim de lhe apresentar os dados coletados no Projeto e cobrar uma postura associada aos moradores que produzem para consumo próprio, no Cinturão Verde.

A Diretoria de Comunicação da Prefeitura não confirmou o evento.

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