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Mato Grosso do Sul, 20 de abril

Higienização profunda de superfícies é realmente necessária?

Limpeza pode prevenir infecção. Máscara, por outro lado, a evita de fato

Por Redação
08/02/2021 • 08h32
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Desde o início da pandemia, dentre as medidas de contenção da doença mais recomendadas por órgãos de saúde está a higienização constante de ambientes e objetos, além do uso de máscaras, do distanciamento físico e de outras amplamente divulgadas pelos meios de comunicação. Apesar da orientação de cuidado constante, o que explica o fato de que tais ações sejam aplicadas com alta frequência e até exigidas em determinadas regiões do planeta se infecções pelo contato com superfícies contaminadas, a exemplo de maçanetas, respondem por uma parcela ínfima dos casos de covid-19 cientificamente comprovados? Dyani Lewis discorre sobre o assunto em artigo na revista Nature.

Para cumprirem os requisitos impostos, diversos setores tiveram de correr contra o tempo e dedicar funcionários à tarefa, o que elevou os custos envolvidos em suas atuações tanto com pessoal quanto com produtos de limpeza. Ao final de 2020, indica Lewis, as vendas globais de desinfetantes totalizaram US$ 4,5 bilhões, um aumento de mais de 30% em relação ao ano anterior. De todo modo, ainda que levantem a dúvida da real necessidade de tanta precaução, mesmo especialistas não se atrevem a afirmar de maneira contundente que ela pode ser deixada de lado.

Não é segredo que, a cada dia, pesquisadores descobrem informações inéditas sobre o novo coronavírus. Entretanto, há perguntas não respondidas, e uma delas diz respeito justamente ao do potencial de transmissão em situações nas quais o microrganismo esteja depositado sobre algum lugar. Que ele é resistente já sabemos, mas as condições específicas de laboratórios não se aplicam ao mundo real – e pode ser que o agente nem dure tanto tempo no supermercado de sua cidade.

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A questão principal é: dar chance ao azar e a possíveis mortes não é exatamente o melhor caminho a se seguir.

Aprofundando investigações

Centenas de estudos foram e estão sendo realizados, assim como não faltam notícias de pessoas supostamente infectadas depois de apertarem botões de elevadores e tocarem o rosto. Ainda assim, nada atesta que essas situações ocorreram como descritas. "O que realmente valorizamos são as investigações epidemiológicas dos padrões de transmissão, seja em domicílios, locais de trabalho ou em qualquer outro lugar", defende o epidemiologista Ben Cowling, da Universidade de Hong Kong. "Eu não acho que temos feito isso o suficiente."

Métodos que poderiam esclarecer eventos do tipo já foram aplicados no passado com outros vírus, como uma pesquisa realizada em 1987 por cientistas da Universidade de Wisconsin-Madison, nos Estados Unidos, que colocou voluntários saudáveis em uma sala para jogar cartas com pessoas infectadas com um rinovírus do resfriado comum. Nela, metade dos voluntários saudáveis ficaram doentes quando estiveram no mesmo ambiente. Por outro lado, em um experimento separado, com apenas cartas e fichas de pôquer contaminadas, todos permaneceram saudáveis. Com o Sars-CoV-2, a técnica seria antiética, uma vez que ele pode ser fatal.

Havendo todas essas limitações, é natural que resultados clínicos pautem o que pode auxiliar a população no dia a dia e aquilo que não desperta preocupação. Acontece que Emanuel Goldman, microbiologista da Rutgers New Jersey Medical School, também nos EUA, explica que, além de o RNA viral, encontrado sobre superfícies, ser o equivalente ao cadáver do microrganismo, experimentos controlados se valem de quantidades muito superiores do material espalhado por aí.

Apesar de não adotar medidas especiais relacionadas a objetos cotidianos, Goldman não dispensa a máscara ao sair de casa, uma vez que nem todos os estabelecimentos realizaram implementações nos sistemas de ar-condicionado e o novo coronavírus é, certamente, transmitido por essa via com uma eficiência assustadora.

Por que não?

Mais de 2,2 milhões de mortes relacionadas à covid-19 e mais de 103,3 milhões de casos foram confirmados no mundo todo até o fim desta quarta-feira (3). Evidências robustas apontam que a proximidade de pessoas gera cenários catastróficos, como os vistos nas últimas semanas no Amazonas, com escassez de recursos e fatalidades que poderiam ser evitadas. Contudo, não se viu algo semelhante relacionado às infecções geradas comprovadamente a partir do contato com superfícies.

A engenheira Linsey Marr defende a importância de que medidas mais potentes nessa área sejam tomadas somente após o devido cuidado com o ar, ou seja, com o tempo e os recursos que sobram depois das ações que fazem diferença de fato. Lavar compras, exemplo, segundo ela, não requer tanta dedicação. "Isso é muito trabalhoso e provavelmente não está reduzindo tanto a sua exposição", acredita. “Uma higiene razoável das mãos, bem como o uso de uma máscara e o distanciamento social para reduzir a exposição de contatos próximos, são jeitos melhores de concentrar os esforços", complementa.

Ainda de acordo com Marr, autoridades não se comprometem a indicar ações porque, com toda essa incerteza, as consequências podem ser devastadoras. "Você nunca quer dizer 'Não faça isso' porque [a contaminação] pode acontecer. E, você sabe, devemos seguir o princípio da precaução", considera. Para a OMS, "as práticas de desinfecção são importantes para reduzir o potencial de contaminação pelo vírus."

Resumindo: na dúvida, por que não? Afinal, não é desejo de ninguém entrar para uma estatística que, infelizmente, não para de crescer.

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